5 de outubro de 2012

Ainda ontem eu estava aqui.



Hoje me sepulto, na casa onde não morei. As recordações da minha avó apenas se refletem nos vidros, que ainda lá estão, por enquanto, enquanto não chegam os caminhões que os levarão para alguma montanha de lixos. Logo partirão também. Os dias em que ela era menina e lá morava, nos promissores rompantes do século 20, produzem analogias: estertores de uma Belém sebastiana; pandeiros de cristal que feriam a madrugada; o beijo húmido na palma da mão. Minha avó, que se chamava Maria Vera Horácio-Castro, há muitos anos dorme profundamente. Sua casa a acompanha, bem como sua cidade. Todos estão dormindo, cada vez mais profundamente.

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